A notícia divulgada na Folha de S. Paulo do último dia 27/02 (União quer ampliar acesso a planos de saúde) é das mais graves ameaças já feitas não apenas ao SUS, mas ao direito à saúde dos brasileiros garantido na Constituição. A célebre frase: “Saúde é direito de todos e dever do Estado”, até hoje, não se materializou em uma conquista efetiva do povo brasileiro, em grande medida, pela sistemática omissão dos sucessivos governos (federais, estaduais e municipais), tanto na já muito falada questão do subfinanciamento quanto na dificuldade em contrapor os interesses do mercado da saúde, que se beneficia da insuficiência do Sistema Único de Saúde.
O caso, agora, não é mais de omissão. A se confirmar o que é anunciado na referida reportagem, estamos diante da submissão do Estado brasileiro aos interesses do mercado da saúde. Tais medidas seriam uma ação proativa do governo no sentido de rifar o direito cidadão à saúde, em prol da “sustentabilidade” de um modelo de assistência à saúde baseado na tecnologia e na especialidade, que já se mostrou ineficiente, caro e incapaz de atender às necessidades de saúde de um povo.
Causa ainda uma angústia enorme saber que essa pauta, por triste que seja, interessa a boa parte do movimento sindical brasileiro, que sistematicamente tem incluído em suas reivindicações o “direito” ao plano de saúde, abandonando a perspectiva solidária, garantida na Constituição, da saúde como um direito de todos.
A imagem do Sistema Único de Saúde junto à população, não sem razão, está associada às filas, à ineficiência, ao calvário de quem precisa de tratamento. Quando o governo federal – liderado pelo Partido dos Trabalhadores – aponta na direção de fortalecer o mercado da Saúde, está como que querendo ressuscitar o INAMPS (modelo que garantia assistência apenas aos que possuíam carteira de trabalho assinada), em uma versão ainda mais pulverizada e totalmente privatizada. Ao invés de um Instituto Nacional, um pool de empresas visando lucrar com a doença alheia…
O significado dessa notícia é o de que o governo entende que deve legitimar um modelo de atenção à saúde em que se oficializa a iniquidade, obrigando as empresas e trabalhadores a aderirem ao mercado da Saúde e reposicionando o SUS, talvez definitivamente, como uma mera alternativa, pobre, para as pessoas pobres que não podem arcar com as despesas de um plano privado.
Entendemos que passa da hora do conjunto dos movimentos sociais que defendem a saúde como direito iniciarem um firme movimento de diálogo com a sociedade brasileira. Se aproxima o momento da batalha, que pode ser decisiva, entre a defesa da saúde como um direito inalienável do cidadão e a saúde-mercadoria, acessível às pessoas conforme seu poder aquisitivo.
Talvez seja a hora de colocar em prática uma sugestão do Prof. Gastão Wagner de Sousa Campos, em entrevista à Radis, que propunha a realização de um plebiscito no Brasil sobre o modelo de assistência à saúde que queremos. Ou enfrentamos os interesses daqueles que lucram com o sofrimento e com a doença, ou enterramos de vez o sonho de uma saúde pública, gratuita e de qualidade para todos os brasileiros. A Equipe do Blog Saúde Brasil não quer assistir ao enterro do SUS.
Se retornarmos aos anais do “Congresso
ResponderExcluirNacional dos Médicos Práticos” (1922), veremos pelo menos três maneiras distintas de enfrentar a questão do domínio do mercado de trabalho e da conquista da autonomia: aceitação, resistência e conciliação.
No “Congresso Nacional dos Médicos Práticos" existiam aqueles que consideravam positivo o incremento de instituições prestadoras
de assistência médica pelo desenvolvimento das cooperativas, das associações de títulos, dentre outras, que depois vieram a constituir um forte segmento de pressão contra o Estado, nem sempre pelo interesse da maioria, mas para "equilibrar as receitas".
No Brasil vivemos desde sempre num limbo indesejável, entre o seco da prática privada e o molhado da prática pública. Somos úmidos em relação ao modelo de prática em saúde: anfíbios, hora na terra, hora na água.
Decidir se saúde/doença pode ou não ser regulada pelo poder aquisitivo é a questão que deve iniciar o debate. Daí até termos a medicina ou as profissões da saúde como profissões de Estado, como são os bombeiros, os juízes e os policiais, vai uma grande distância...
Abraços, Antonio (SMS Ctba e Univ Positivo)