MARIA HELENA CAETANO
Presidente da Associação Brasileira de Enfermagem em Nefrologia (Soben)
HÉLIO VIDA CASSI
Presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT)
RENATO PADILHA
Presidente da Federação Nacional das Associações de Pacientes Renais e Transplantado do Brasil (Fenapar)
no Correio Braziliense
As doenças renais vêm crescendo nos últimos anos. Os hábitos da vida moderna e o envelhecimento da população têm provocado a deterioração da função dos rins de milhares de brasileiros. Estima-se que entre 10 e 15 milhões de brasileiros apresentam algum grau de comprometimento desse órgão, elevando o número de pacientes em diálise no país, que já superou os 100 mil. Ao longo dos últimos 10 anos, a quantidade de pessoas com doença renal grave mais que dobrou. Assim, no mês de março, em que ocorre o Dia Mundial do Rim, faz-se um alerta para a prevenção, os cuidados adequados e o fortalecimento da rede de saúde para frear essas estatísticas.
O primeiro desafio é a manutenção de hábitos de vida saudáveis. O sal, o açúcar e as gorduras estão entre os principais responsáveis pela situação atual. É importante observar que mais da metade das pessoas com doenças renais graves são pacientes que tiveram complicações da diabetes e hipertensão, que atingem, respectivamente, 8% e 25% da população brasileira. Além do histórico familiar, engrossam os fatores de risco o excesso de peso, que alcança 50% dos brasileiros, o tabagismo, 18%, e o envelhecimento da população, 10%.
A alimentação adequada e o correto acompanhamento das doenças crônicas aliados à atividade física são fundamentais para a qualidade de vida e a preservação das funções renais. Uma das grandes barreiras no Brasil é a ainda detecção tardia da doença renal. A maior parcela dos pacientes descobre a enfermidade quando os rins já estão gravemente comprometidos. As doenças renais são silenciosas, apresentando seus primeiros sintomas somente quando mais de 50% do órgão está comprometido.
Nesse aspecto, é reforçada a necessidade de um sistema de saúde estruturado, que garanta o diagnóstico precoce da doença. A orientação da população para a presença de diabetes mellitus e hipertensão arterial, além da realização de exames de rotina, podem anunciar problemas nos rins, como o teste de sangue para creatinina e a detectação da presença de proteína ou sangue na urina. O correto acompanhamento desses pacientes permite a estabilização da doença em seus estágios iniciais, interrompendo o agravamento.
O governo federal ensaia o lançamento de uma política setorial, com base em consultas públicas do ano de 2013. A iniciativa deve fortalecer a prevenção e o tratamento precoce. A ação, no entanto, requer um olhar e revisão sobre a estrutura do sistema público para manter a sua sustentabilidade, sob o risco de o novo texto ficar apenas nas boas intenções. A política é bem-vinda e esperada, pois estudos nacionais mostram que a prevenção da doença renal crônica poderia reduzir o custo para o SUS em mais de R$ 1 bilhão ao ano e poupar a vida de mais de 27 mil brasileiros anualmente. O marco, isoladamente, não resolverá os desafios perseguidos pelos profissionais, gestores e pacientes das doenças renais.
A diálise peritoneal, feita em casa e diariamente, é utilizada somente por 6% dos pacientes, sendo que a experiência internacional mostra que, em média, de 20% a 30% da população em terapia renal substitutiva utiliza o método. O Ministério da Saúde admite que 90% poderiam utilizar a tecnologia, mas há 10 anos não concede reajuste à terapia -- no México, 80% dos pacientes estão em diálise peritoneal. Ainda, considerando que 100 mil pessoas estão em hemodiálise -- feita quarto vezes por semana em uma clínica -- ou diálise peritoneal atualmente, as prevalências de tratamento de países vizinhos mostram que, pelo menos, outras 40 mil pessoas não têm acesso aos serviços de saúde e devem morrer desassistidas pela rede pública. Finalmente, a desigualdade na distribuição nacional do suporte e da estrutura para o transplante causa sofrimento àqueles que precisam da cirurgia
No acesso ao tratamento, será preciso fortalecer a rede existente e ampliar o atendimento regional, para além dos centros urbanos, superando os entraves logísticos e adequando o financiamento. O modelo adotado até o momento está próximo do esgotamento. Na pauta, ainda se espera o debate sobre o adequado transporte de pacientes em diálise e uma política clara sobre invalidez e aposentadoria dos doentes renais. Os profissionais de saúde devem estar sensíveis e bem orientados sobre o diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes.
O agravamento do cenário nacional traz a urgência de enfrentarmos esse problema. Queremos avançar em medidas que garantam a qualidade de vida da população e o correto acesso à rede de saúde. O mote que está sendo divulgado este ano é "Seja amigo do seu rim". Trata-se de uma ação intersetorial, envolvendo médicos, enfermeiros e pacientes. A ação é uma mostra da necessidade e da capacidade de serem construídas respostas conjuntas e sustentáveis para o setor.
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