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domingo, 15 de março de 2009

Nem paletó nem gravata

na Carta Capital

Pedro Alexandre Sanches

Já imaginou o "Tremendão" Erasmo Carlos de terno e gravata, presidindo uma gravadora? Não, isso não existe, não é verdade. Mas é.

A gravadora Coqueiro Verde iniciou atividades há dois anos, pilotada por Léo Esteves e Marcos Kilzer.

Léo é o filho caçula de Erasmo. Kilzer, além de ex-executivo de gravadoras multinacionais, é filho de Jair Amorim (1915-1993), co-autor, com Evaldo Gouveia, de emblemas da antiga canção romântica nacional, como Sentimental Demais, Brigas, Alguém Me Disse, Conceição, Alguém Como Tu, Tango para Teresa, Onde Estarás...

Léo co-pilota o negócio há dois anos, mas eu não me lembrava de, até há pouco, ouvi-lo falar abertamente sobre o real ponto de partida da gravadora, que por sinal já estava inscrito no nome de batismo da empresa - Coqueiro Verde é um samba-rock de Erasmo & Roberto, lançado em 1970, no álbum Erasmo Carlos e Os Tremendões. É aquela que diz assim que já fumei um cigarro e meio e Narinha não veio.

Pois bem, Erasmo Carlos é mesmo o patrão. "No dia-a-dia, quem administra somos eu e o Kilzer. Mas no contrato social Erasmo é o dono, a empresa é dele. É o presidente do conselho, aquela coisa do pajé", conta Léo. E brinca: "Ele vem aqui de 15 em 15 dias assinar os cheques".

Conforme Léo descreve a empresa, é possível perceber que a participação de Erasmo não é só pró-forma. "A gente leva para ele listas de títulos a serem lançados, ele opina muito. como saiu da Tijuca, tem aquela ligação com o rock (dos anos 1950), e quer lançar dvds de Elvis Presley, Carl Perkins, Fats Domino, Ray Charles, como se fosse uma retribuição dele à música de forma geral."

Tal preocupação, diga-se, já estava presente no artista pelo menos desde 1972, quando lançou o lindamente idílico LP Sonhos e Memórias - 1941-1972 - nas entrevistas de então, sempre manifestava carinho, nostalgia e preocupação com os pioneiros do rock'n'roll, já em declínio àquela época. E segue naquela pista aé hoje, como demonstrou, por exemplo, o dvd das apresentações de Elvis Presley no Ed Sullivan Show.

O filho de seu Esteves acrescenta mais informações: "Erasmo sempre quis ter outros negócios. teve restaurante, boate. mas viu que tinha que investir em música mesmo". De fato, a Coqueiro Verde não é sua primeira experiência no gênero do it yourself. Nos anos 1980, Erasmo abriu a gravadora independente Lança, em parceria com Jairo Pires (co-produtor, por exemplo, do álbum de estréia de Tim Maia, de 1970). a lança durou pouco tempo, mas veiculou trabalhos de gente de gabarito como Tim Maia, Paulo Diniz, Walter Franco, Antonio Carlos & Jocafi.

De volta ao presente, a coqueiro verde não possui um elenco propriamente firmado. O maior carro-chefe deverá ser o próximo disco de, adivinhe, Erasmo Carlos. Sai ainda neste semestre, com produção do parceiro e ex-mutante Liminha. Léo descreve os humores do pai-patrão: "Ultimamente ele estava fazendo samba-rock, balada. este será um disco de resgate do Erasmo Carlos, mas não o da jovem guarda, e sim a coisa mais crua, o seu lado roqueiro". A propósito, a fase de rock cru do artista rendeu alguns de seus melhores títulos, como o histórico Carlos, Erasmo... (1971), 1990 - Projeto Salva Terra! (1974), o extraordinário Banda dos Contentes (1976) e Pelas Esquinas de Ipanema (1978).

O que faz a gravadora atual, se não tem elenco fechado, é algo intrincado de explicar, mas você pode recolher informações completas no site oficial da Coqueiro Verde(http://www.coqueiroverderecords.com.br/ ). pode-se registrar, a título de exemplo, a coligação com o selo também independente Discobertas ( http://www.discobertas.com.br/ ), do jornalista e escritor Marcelo Fróes, ocupado em recuperado faixas raras de artistas como Jackson do Pandeiro e Zé Ramalho.

O próximo lançamento Discobertas/Coqueiro será um álbum duplo dos (sempre subestimados) Golden Boys (cantores de, entre outras, Erva Venenosa, Alguém na Multidão, Fumacê), com material lançado originalmente entre 1958 e 1965.

Outro acordo recém-firmado é com o poderoso grupo de comunicação Freemantle Media (inventor, por exemplo, do formato American Idol). Nesse contrato de licenciamento, a Coqueiro lançará em DVD o autodocumentário For the Record, de Britney Spears. Os independentes também querem vender e ganhar dinheiro.

Léo Esteves explica, sem meias palavras, como a pequena gravadora tremendona conseguiu se associar ao mamute Freemantle, e como o audiovisual mainstream de Britney foi parar em seu colo, e não em qualquer das multinacionais do disco: "O Brasil tem fama de mau pagador, e nós só tentamos fazer o básico, pagar royalties e direitos autorais. e, também, as majors não têm estrutura ou não se interessam em lançar, a Sony daqui não lança produtos da Sony França, da Sony Itália...".

E arremata: "Nessa lacuna procuramos atuar, vira uma oportunidade para pequenas empresas. nós temos maior agilidade, não precisamos de plano de marketing nem de um monte de reunião para tomar decisões. a gente resolve tudo rapidinho".

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