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sábado, 12 de dezembro de 2009

Comitê atua na prevenção da mortalidade infantil e neonatal

Informe Ensp

A redução da mortalidade infantil é um desafio para os serviços de saúde e para a sociedade como um todo. Faz parte dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, compromisso assumido pelos países da Organização das Nações Unidas (ONU), do qual o Brasil é signatário, que tem como meta diminuir os maiores problemas do mundo. Em 2007, o Ministério da Saúde (MS) propôs a realização de uma pesquisa nacional para mapear a distribuição da mortalidade infantil e dos Comitês de Prevenção do Óbito Infantil e Neonatal nos estados e municípios da federação. A Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), por intermédio da pesquisadora Silvana Granado, ficou responsável pelos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo. O primeiro estado apresentou um baixo desempenho na instalação dos comitês municipais. O tema foi pauta de uma oficina realizada na Escola e que teve como objetivo discutir o incentivo à vigilância do óbito infantil e fetal e a implementação dos comitês municipais de Prevenção do Óbito Infantil e Neonatal. Em entrevista ao Informe Ensp, Silvana Granado, e os pediatras do Programa de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente, Claudia Maria da Silva Costa e Lauro Freitas Felício, tratam dos resultados da pesquisa, do papel dos comitês e do principal objetivo do trabalho desenvolvido: prevenir os óbitos evitáveis.


Qual o resultado da pesquisa?

Silvana Granado: O MS tem várias políticas voltadas para a questão da mortalidade infantil. Uma delas trata da instituição de comitês para discutir os casos de prevenção do óbito infantil. A área da saúde da criança do ministério não tinha noção de como se davam os casos e os números em todo o país. Então foi realizada uma pesquisa em municípios do Norte e Nordeste com mais de 80 mil habitantes e, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com mais de 80 mil habitantes e com taxa de mortalidade infantil maior ou igual a 15 óbitos por mil nascidos vivos.

Na Ensp ficamos responsáveis por fazer um levantamento no Rio de Janeiro e no Espírito Santo. Após o término do trabalho, constatamos que o Rio tinha um baixo desempenho com relação à mortalidade e à ação dos comitês. Aqui, tivemos 19 cidades, incluindo a capital que, mesmo não tendo um alto índice de mortalidade, foi incluída da mesma forma que todas as outras capitais do país.

Cláudia Costa: Participei da pesquisa com a Silvana e, na época, fizemos uma entrevista baseada em um formulário com várias perguntas, dentre elas se existia um Comitê Municipal de Prevenção do Óbito Infantil e Neonatal formalizado, se existia investigação dos óbitos, a porcentagem dessa investigação e se, a partir dela, medidas eram propostas para resolver os problemas da mortalidade.

A que se atribui o mau desempenho do Estado?

Silvana: Dos município do Rio, menos de um terço deles tinha um comitê de prevenção ao óbito infantil e fetal. Quando tentamos descobrir a causa, as pessoas falaram da dificuldade de compor equipes, da falta de apoio dos gestores, da necessidade de adesão de outros profissionais. Mesmo assim, dentre os poucos locais que dispõem do comitê, apenas um quarto realizava encontros com frequência ou funcionava de forma regular.

Cláudia: A pesquisa propôs uma segunda fase com os municípios participantes. Esta consistia na realização de oficinas de sensibilização para a implementação e implantação dos comitês e está sendo feita agora em 2009. Em setembro, realizamos um primeiro encontro com a capital e a Região Metropolitana 1. Agora, estamos realizando a oficina com os municípios da Metropolitana 2 e a Baixada Litorânea.

Nessas oficinas, além de serem apresentados os dados de cada município em relação à mortalidade, a gente tem uma planilha que pontua se a cidade tem um comitê, se faz a investigação e se tem alguma proposta a partir dessa investigação. O encontro é importante porque temos, numa mesma região, municípios em vários estágios de implantação. Esse encontro, além de fortalecer a saúde da criança e dos profissionais que atuam nessa área, pode sensibilizar os gestores a respeito da importância de prevenir o óbito infantil.

Qual o papel dos comitês?

Silvana: No âmbito nacional, a Secretaria de Vigilância em Saúde é responsável pela investigação do óbito. Investigar é levantar os dados, seja no hospital, no domicílio ou em qualquer lugar onde for necessário coletar a informação. Porém, em muitos casos, essa investigação e feita de forma burocrática e não é usada. O papel do comitê é dar uma qualidade a essas informações e analisar o que levou ao óbito infantil. Se o óbito foi na maternidade, o comitê vai investigar com foi o pré-natal dessa mulher. Se a criança morreu de diarreia com 6 meses de idade, ele vai analisar os fatores ambientais, se a mãe procurou uma unidade de atenção básica, os medicamentos tomados. Tudo com o objetivo de verificar se era um óbito evitável ou qual tipo de ação poderia tê-lo evitado.

Cláudia: Existe o Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) que traz um relatório sobre as causas básicas do óbito. Como a maioria das mortes, cerca de 90 a 95%, ocorre no nível hospitalar, é possível verificar, por meio da investigação dos prontuários, se a mãe recebeu um atendimento adequado ou se houve complicação na hora do parto.

Portanto, as informações sobre o óbito são levadas para o comitê, e é feita uma classificação da 'evitabilidade' da morte. Aproximadamente 70% dos óbitos infantis são evitáveis. A partir disso, a gente faz um resumo para detectar em qual momento nós do serviço de saúde falhamos. E então propomos medidas de prevenção para que não ocorram mortes nas mesmas circunstâncias. É preciso saber onde aconteceu a falha do serviço de saúde. Esse é nosso objetivo.

Que tipos de intervenção os comitês podem propor?

Claudia: O comitê faz relatos e propõe medidas que podem ser encaminhadas para a unidade em que ocorreu o óbito ou para os secretários e gestores de saúde. Quando se chega num patamar abaixo de 20 mortes por mil nascidos vivos - o Estado do Rio de Janeiro está em torno de 17 -, cada caso desse óbito deve ser avaliado individualmente para que a gente possa definir qual será a melhor estratégia de prevenção. Caso exista uma área de moradia que teve um número acentuado de mulheres que são adolescentes e não fizeram um pré-natal, há como intervir naquela área com postos de saúde e programas voltados para a gravidez na adolescência. Dessa forma, o Estado pode dar condições para que a adolescente grávida tenha uma boa gestação e o bebê nasça bem. O comitê não é punitivo; ele dá orientação e tenta propor soluções para os problemas.

Lauro Felício: A mortalidade infantil pode ser combatida. Diminuir doenças congênitas na gestação é mais difícil que diminuir a mortalidade infantil. Em muitos casos, dependemos de ações de saneamento ou uma medida mais eficaz de proteção à criança. Criança não deve morrer.

Como funciona o comitê no Estado do Rio?

Felício: O estado tinha um comitê mais antigo, o Comitê Estadual de Vigilância da Mortalidade Materna. A morte materna é mais rara e menos frequente que a infantil. Tanto que a estatística da taxa de mortalidade materna é dada por um óbito por cem mil habitantes, e a infantil é um por mil. Ainda nos encontramos na casa dos dois dígitos, mas queremos reverter isso.

O modelo estadual trabalha com um grupo técnico executivo que inclui o Programa Saúde da Criança, o Programa Saúde da Mulher, o Núcleo Central de Vigilância Hospitalar, a Estratégia Saúde da Família e a Coordenação de Dados Vitais. A dimensão do óbito infantil é grande no estado, e a gente adotou uma estratégia de implantação do comitê diferente da mortalidade materna. Optamos pela descentralização da investigação dos óbitos. Cada município investiga as suas mortes e envia para nós os dados. Trabalhamos nisso desde 2003, com informações da Coordenação de Dados Vitais.

Como se classificam as mortalidades infantis?

Cláudia: A mortalidade infantil possui um dado padronizado para óbitos em crianças com menos de 1 ano de idade. No entanto, essa mortalidade é dividida em dois componentes: a mortalidade neonatal, que compreende os óbitos em crianças com menos de 28 dias de idade; e a mortalidade pós-neonatal, que vai do 28º dia de vida até o primeiro ano de idade. Essa classificação é feita para se estudar melhor o que levou a criança ao óbito.

O período neonatal é dividido em neonatal precoce, quando o óbito ocorre até o sexto dia de vida; e o neonatal tardio, que vai do sétimo dia de nascimento até o 28º oitavo. A mortalidade neonatal é influenciada pelas condições anteriores ao período de gestação, mas principalmente em relação à própria gravidez, ao parto e ao puerpério. A gente chama essas causas de determinantes perinatais. São influenciadas pelas consultas de pré-natal e sua efetividade até o momento do parto. Já os determinantes da mortalidade pós-neonatal estão relacionados ao ambiente, às condições da família, da alimentação, da poluição a que são expostas e às ações de saneamento.

Felício: A redução da mortalidade infantil se deu primeiro pelas causas pós-neonatal. Essas causas atingem um número maior de pessoas. Quando se tem uma morte por diarreia e se introduz a terapia de reidratação oral, há a diminuição de casos. Quando são implementadas ações de saneamento básico e esgoto, atingimos uma massa muito grande. Portanto, a pós-neo teve um declínio maior, mas temos que atuar nas causas neonatais.

A redução da mortalidade infantil é um dos Objetivos do Milênio propostos pela ONU. Ao todo, 191 países assinaram o acordo que prevê a redução da mortalidade infantil em 75% até 2015, com base nos índices de 1990. O Brasil vai conseguir atingir a meta?

Cláudia: A redução da mortalidade infantil é um desafio para os serviços de saúde e para a sociedade como um todo. É um dos objetivos do MS, e nosso país tem muitas desigualdades, com índices equivalentes aos países desenvolvidos e outros relacionados aos países de extrema pobreza.

Um dos principais desafios é justamente prevenir os óbitos evitáveis. Criança é como gestante: nenhuma grávida tem que morrer, pois gravidez não é doença, e mesmo assim temos mães que morrem. Ao nascer, o bebê não deve falecer; nem nos primeiros dias de vida. A ordem natural é que a gente cresça, envelheça e morra..

Silvana: Estamos praticamente chegando à média que teríamos de atingir para alcançarmos a meta estabelecida pelos ODM. No entanto, sabemos que se trata de uma média e temos de alcançar esse número em todos os municípios. O Brasil, entre 2002 e 2005, reduziu em 15,7% a mortalidade infantil. A meta seria a gente reduzir a mortalidade em dois terços entre 1990 e 2015. Em 1991, o Brasil tinha uma taxa aproximada de 44 óbitos para cada mil nascidos vivos. A estimativa é que, em 2014, a gente tenha 12,9 óbitos, quando a meta para 2015 é 14,4. A gente deve atingir esse número antes da meta projetada para o Brasil.

Que resultados esperam do encontro realizado na Ensp?

Silvana: Vimos pelas apresentações que, em muitos lugares, o profissional atua sozinho, sendo o único responsável pela área da saúde das crianças, da mulher e dos adolescentes, fora a péssima remuneração. A oficina é no sentido de sensibilizar, dar um gás para esses profissionais constituírem os comitês nos seus municípios. Convidamos pessoas da atenção básica, da atenção à mulher, à criança, da vigilância epidemiológica. Essa oficina tem a função de fazê-los ouvir, compartilhar as dificuldades e terem o apoio do estado e do MS.

Claudia: Além de tentarmos fazer com que cada município possa ter seu comitê de investigação, queremos mostrar que óbito pode ser evitado. Medidas simples podem fazer isso. As pessoas saem daqui fortalecidas para seus locais de trabalho e é isso que desejamos.

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