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sábado, 13 de março de 2010

Saúde do servidor fica à míngua no PR


Em oito anos, governo aumentou investimento no atendimento a servidores em 14%. Inflação do período, porém, foi de 64%

Os investimentos feitos pelo governo do estado no Sistema de Assistência à Saúde (SAS) nos últimos anos não acompanharam o crescimento da demanda. A espera e a dificuldade para se agendar cirurgias, exames e consultas mostram que o sistema, que atende 410 mil funcionários públicos estaduais, enfrenta sérios problemas.
Em 2002, o governo aplicava R$ 18,57 por pessoa ao mês no SAS. Oito anos depois, o valor subiu para R$ 21,20: ou seja, aumento de 14%. O problema é que isso, segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeco nômicos (Dieese) não é nem de perto suficiente para repor a inflação do período, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Entre 2002 e 2009, a variação de preços dos serviços médicos foi de 63%. Isso significa que seria necessário um aumento de 43% para que a defasagem em relação a 2002 fosse coberta.
Périplo para fazer consultas e exames
Aos sete meses de gestação, Eliane Rodrigues Ismael reclama do atendimento que recebeu pelo SAS durante o pré-natal. Segundo o marido, Wagner Brandão, a moça fez apenas uma ecografia, aos dois meses de gravidez. “Ela tem uma gestação de risco, já perdeu outros dois bebês e está com diabete gestacional. Essa semana ela estava com dor e fomos ao Hospital Santa Brígida, onde ela foi atendida de emergência e diagnosticada com infecção urinária. O médico, então, solicitou uma ecografia de emergência, que teria de ser feita no Hospital São Vicente. Mas chegamos lá e fomos informados de que o exame só poderia ser feito em junho”, reclama.
Governo diz que sistema expandiu
O governo do estado, por meio da Secretaria de Estado da Administração e da Previdência (Seap) e seu Departamento de Assistência à Saúde, diz que entre 2003 e 2009, na atual gestão, o número de municípios com pontos de atendimento do SAS triplicou em relação a 2002. Antes, eram 11 municípios.
São Vicente reclama de repasses
Para a direção do Hospital São Vicente, que presta atendimento aos beneficiários do SAS em Curitiba, os valores recebidos são “irreais”. “Além de insuficientes, os valores são iguais para todas as faixas etárias”, diz Marcial Ribeiro, diretor do hospital.
Quando foi criado, o SAS tinha cerca de 350 mil usuários e recebia recursos de R$ 78 milhões por ano, segundo a Secretaria de Estado da Adminis tração e da Previdência (Seap). Hoje, o sistema conta com 410 mil beneficiários e um orçamento anual de R$ 104,3 milhões, que representa uma média mensal de R$ 8,7 milhões.
Para o economista e supervisor técnico do Dieese Paraná, Cid Cordeiro, a variação da inflação nos serviços médicos é um referencial para discutir os preços. Mas também é preciso discutir a eficiência do serviço. “O serviço não está bom porque não aumentou o investimento ou porque os hospitais não estão fazendo um bom atendimento?”, questiona.
Na percepção dos usuários, a falta de investimento é evidente porque o reajuste não foi suficiente para barrar a inoperância e os gargalos do SAS. Isso se reflete hoje em uma onda de reclamações na capital e no interior. De acordo com servidores públicos, a média de espera para uma consulta com um clínico geral é de mais ou menos 30 dias. Em alguns casos, só após passar pelo clínico geral os usuários conseguem atendimento com um especialista, mas é preciso aguardar pelo menos três meses. Há beneficiários que estão há mais de nove meses tentando fazer um exame.
“O valor de investimento cresceu pouco, mas explodiu o número de servidores”, diz o professor e secretário de saúde do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato), Idemar Vander lei Beki. Para o professor, os valores aplicados pelo governo hoje inviabilizam a oferta de procedimentos de alta complexidade e tornam difícil até mesmo a disponibilidade de serviços de atenção primária – exames básicos, como o hemograma. Conforme cálculos da APP, para garantir o atendimento, o investimento deveria ser de no mínimo R$ 13 milhões mensais.
Segundo Beki, o atendimento precário em todo o estado tem levado servidores a procurarem a rede particular ou serviços oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Na avaliação da coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores e Servidores em Serviços Públicos da Saúde Pública e Previdência do Estado do Paraná (Sindsaúde) e membro do Fórum de Saúde Popular Elaine Rodella, o problema do SAS é o modelo. “O problema não é quanto o governo repassa. É que, para a medicina privada, o lucro nunca será suficiente”, diz.
Para se discutir um novo modelo, Elaine defende transparência no sistema, porque hoje os sindicatos e os próprios usuários não têm acesso ao número de pessoas que os hospitais conveniados atendem. “Se meu salário está na página da internet, por que o sindicato não pode ter a planilha de quantos usuários são atendidos e quanto foi o custo dos procedimentos?”, questiona. O Sindsaúde também alerta que há hospitais que se recusam a entrar nas licitações abertas pelo governo na tentativa de fazer pressão para aumentar o preço do serviço.
Criado no governo anterior para substituir o antigo Instituto de Previdência do Estado (IPE), que era responsável pelo atendimento da saúde dos servidores, o SAS atende hoje servidores estaduais do poder Executivo, inclusive o Ministério Público. Tam bém recebem o benefício funcionários do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Contas.
No sistema do antigo IPE paranaense, os servidores públicos tinham desconto em folha pagamento para receber atendimento médico, mas na avaliação deles o sistema era melhor. “Muita gente fala que tem saudade do tempo do IPE”, diz a presidente do Nú cleo Regional da APP-Foz, Tânea Maria Costa de Jesus.

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