no blog Direito Sanitário: Saúde e Cidadania
Lenir Santos[1]
Alguns gestores da saúde vêm argumentando que EC-29 não definiu o que são e o que não são ações e serviços de saúde, tendo deixado para a lei complementar à EC 29. Esse argumento tem servido para que os mesmos não cumpram a Constituição no tocante aos percentuais de receitas que obrigatoriamente devem ser aplicados na saúde.
O que são ações e serviços de saúde está na Constituição, art. 200, desde 1988, e na Lei n. 8.080, desde 1990.Não há dúvidas de que ações e serviços de saúde são as atribuições que a Constituição conferiu ao SUS, complementada por outras definidas em lei (CF art. 200).
Alias, se não se soubesse o que são ações e serviços de saúde não deveria nem mesmo haver um Ministério para cuidar do setor, porque esse não saberia quais seriam suas atribuições, o que deveria fazer.
O art. 200 da CF ao estatuir não serem aquelas atribuições exaustivas, tendo deixado para a lei o poder de incluir outras ações e serviços classificados como de saúde, permitiu à lei o poder de ampliar aquele elenco. Assim, a Lei 8.080 estatuiu em seu art. 6º outras atribuições da saúde, ampliando o leque inicial do art. 200 da CF.
Por outro lado, não se poderia deixar, ainda, de argumentar, que o art. 3º da Lei 8.080, ao dispor sobre os fatores condicionantes e determinantes da saúde, já excluiu do rol de sua atuação todas as atividades que interferem e condicionam a saúde humana, como moradia, emprego, renda, educação, alimentação, lazer etc.
Esses fatores não estão no campo de atuação da saúde, mas sim de outros setores públicos, não sendo atividades que devam ser gerenciadas pela saúde, nem financiadas pelos seus fundos específicos.
Desse modo, a melhor construção hermenêutica para conciliar, de maneira sistêmica, as regras constitucionais e legais seria: a) a Constituição definiu algumas ações e serviços de saúde no art. 200, tendo deixado para a lei a definição de outras; b) a Lei n. 8.080 estabeleceu em seu art. 6º um rol de ações e serviços; c) os determinantes da saúde, mencionados no art. 3º da Lei n. 8.080, não se confundem com atividades de saúde, sendo atividades que condicionam a sua qualidade, sendo própria de outros setores.
Nesse sentido, a Constituição e leis já definiram o que são ações e serviços de saúde, não havendo fundamento para que Estados e Municípios insiram nas despesas com saúde serviços de outras áreas.
Lembramos, ainda, que a Portaria-MS n. 2.047, visou clarear o que está na Constituição e na Lei. Não aumentou, não diminui nem alterou o seu conteúdo, apenas o explicitou. O mesmo ocorreu com a Resolução n. 322, do CNS.
A definição do que sejam ações e serviços de saúde consta do projeto de regulamentação da Emenda, não por exigência da EC. A EC (art. 198, § 3º da CF), impõe à lei complementar o disciplinamento de: a) os critérios de rateio dos recursos da União para Estados e Municípios e dos Estados para os Municípios; b) os percentuais da União; c) as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde; d) as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União (art. 198, § 3º).
Lembramos que há uma ação impetrada pelo MP contra o Governo do Estado do Paraná por não ter aplicado 12% de suas receitas na saúde. MP acabou de ser vitorioso no tribunal superior.
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[1]Lenir Santos é coordenadora do IDISA – Instituto de Direito Sanitário Aplicado, advogada em direito da saúde.
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