recebi de minha amiga Dra Lucia Rodrigues
Ao abrir a porta da enfermaria, já foi possível avistar Juliana, 9 anos, paciente da Ortopedia do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba. Internada para um sério tratamento no quadril e nas pernas, a garota pouco se importava com os tensores amarrados aos membros, que a impediam de fazer qualquer movimento fora da cama. Toda sua atenção estava voltada para a tela do notebook colocado em seu colo, no qual, pouco a pouco, ela construía o resultado da pesquisa que realizou sobre o funcionamento do aparelho respiratório.
Com o acompanhamento da professora Sandra Carvalho, a menina montava uma apresentação da pesquisa, que teve início a partir da sua própria curiosidade sobre o ato de respirar. “Eu achava que eram duas veias que saíam do nariz e iam direto para o coração, e quando o coração batia mandava o ar para fora de novo”, conta. A partir da primeira hipótese da respiração feita pela menina, os professores do hospital a estimularam a pesquisar sobre o assunto, até descobrir a teoria correta. “Partindo da vontade dela de saber como funciona a respiração, nós levamos outros conhecimentos e ela estudou ciências, leu bastante, escreveu, e agora ela vai fazer uma apresentação em Powerpoint para mostrar aos colegas o que ela aprendeu. Isso significa disseminar conhecimento”, declara a assistente de coordenação do setor de Educação e Cultura do hospital, Maria Gloss.
É nessa linha que funciona o trabalho realizado pela equipe de professores do Pequeno Príncipe. Formado por quatorze educadores – entre professores das redes municipal e estadual de ensino, além dos profissionais contratados pelo próprio hospital –, o setor de Educação e Pesquisa existe formalmente desde 2000, mas o atendimento escolar já é praticado na instituição desde 1989. Essa prática é apenas um exemplo do que hoje se conhece como pedagogia hospitalar.
A primeira classe hospitalar do país surgiu na cidade do Rio de Janeiro, no início da década de 50, no Hospital Municipal Jesus, e se tornou referência nacional no âmbito da educação especial transitória por manter suas atividades em funcionamento ininterruptamente até os dias de hoje. A importância das classes hospitalares já é reconhecida legalmente por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente Hospitalizado, na resolução nº 41 de outubro de 1995, que em seu item 9 fala sobre o “Direito de desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar durante sua permanência hospitalar”. Em novembro de 2000, foi aprovada a lei 10.685, que determina que hospitais ofereçam às crianças e adolescentes um bom atendimento educacional, que permita o desenvolvimento intelectual e pedagógico, bem como o acompanhamento do currículo escolar. Porém, mesmo com a pr evisão legal, a prática não é corriqueira. Ainda não são todos os hospitais pediátricos brasileiros que dispõem de uma estrutura adequada. Em todo o Estado de São Paulo, por exemplo, há cerca de 35 classes hospitalares em funcionamento – um número considerado pequeno perto do número de internações infantis.
A pedagogia hospitalar é um assunto em voga. Desde o surgimento da lei de 2000, vários cursos de especialização na área foram surgindo no país, o que vem chamando a atenção de pedagogos e educadores que desejam exercer a profissão em outro espaço, fora da escola. Entre as matérias ministradas nos cursos de especialização, estão “Infecção Hospitalar”, “Brinquedotecas em Hospitais”, “Psicopedagogia Hospitalar” e “Políticas de Humanização dos Sistemas de Saúde”. Porém, a necessidade de um preparo especial para atuar em classes hospitalares levanta polêmica, principalmente entre os profissionais que já atuam no setor. “Particularmente, não acho que seja necessária a especialização em educação hospitalar. A nossa equipe é composta por quatorze professores, todos com anos de experiência em sala de aula, e não tem nada que nós façamos aqui que não tenhamos feito na escola. O que precisamos é de bons professores” , declara o coordenador do setor de Educação e Cultura do Pequeno Príncipe, Cláudio Teixeira, que é psicólogo e desde que saiu da faculdade trabalha com educação. No hospital, ele começou a trabalhar em 2000, quando a instituição passava por vários processos de humanização do atendimento. Em 2002, foi aberto o setor de Educação e Cultura, do qual ele assumiu a coordenação.
Cláudio explica que todas as atividades propostas às crianças internadas e o desempenho que elas alcançam estão em constante avaliação, dentro de um contexto pedagógico. A partir do quinto dia de internamento da criança, os professores já iniciam o trabalho com o novo aluno. Todo o acompanhamento pedagógico é feito pela equipe do hospital, mas a escola da criança é sempre notificada do trabalho que está sendo realizado durante o internamento. Essa conexão escola-hospital permite ao aluno o acompanhamento do conteúdo que está sendo passado à turma a qual pertence. “Nós sabemos que essas crianças estão aqui para um sério tratamento de saúde, e esse é o foco. A qualquer momento ela pode ser chamada a fazer um exame ou uma cirurgia. Por isso, não são elas que vêm até nós. Nós vamos até elas, levando atividades educacionais e culturais na enfermaria, no isolamento ou no corredor”, declara o coordenador. Duran te o período de internamento, o professor registra tudo o que foi trabalhado em uma ficha de tutoria. Após a alta, o educador escreve um parecer, que é enviado à escola junto com todas a atividades desenvolvidas pelo aluno no hospital. Esse documento auxiliará a instituição de ensino no processo de readaptação da criança ao dia-a-dia escolar.
Entre as várias opções de atividades oferecidas pelo hospital, uma que se destaca é a “Ciranda do Saber”, em que um paciente faz uma apresentação sobre determinado tema que pesquisou. A atividade acontece na sala própria do setor e reúne crianças, adolescentes, pais, acompanhantes e professores em uma grande roda de conhecimento. No dia da visita da reportagem ao hospital, estava acontecendo uma ciranda sobre o Egito, apresentada por uma paciente da ortopedia, estudante do 2º ano do ensino médio. O que mais impressionava nos pacientes que acompanhavam a apresentação da colega era a curiosidade que saltava em seus olhos, a sede de aprender, de descobrir, que vencia a fraqueza e as doenças. Por isso, o ambiente não assusta – encanta. Principalmente por uma característica importante de qualquer classe hospitalar, seja ela onde for: a diversidade, um desafio para muitos professores.
Foi essa característica que conquistou de vez a professora Maria Gloss. Há três anos trabalhando no hospital, depois de anos de trabalho em escolas municipais de Curitiba, Maria declara que foi ali que ela encontrou a escola que procurou a vida toda. “Aqui a gente tem a oportunidade de trabalhar com a vida. É a escola mais saudável que eu conheço. Isso parece muito dual, porque eu estou dentro de um hospital. Mas é um espaço de cura até para a escola, o que eu vivencio aqui é isso”, emociona-se.
Também foi nessa diversidade que a professora Eneida Simões da Fonseca se realizou profissionalmente. Para Eneida, que é PhD em Desenvolvimento e Educação de Crianças Hospitalizadas pelo Institute of Education – University of London e tem mais de vinte anos de experiência na área, o professor que deseja trabalhar no âmbito hospitalar precisa de sensibilidade para atender as necessidades e interesses que emanam na diversidade. “Há duas características essenciais a um professor no ambiente hospitalar. Uma é estar consciente de que há um espaço para ele no ambiente hospitalar. Para tal, não deve esquecer que isto implica uma outra característica, que é o compromisso com o direito da criança doente à escolaridade. Acho um equívoco o professor ter que dominar aspectos médicos. O que é necessário é o domínio da transdisciplinariedade, da diversidade dos alunos, para atender suas necessidades de aprendizado”, de clara.
Com o acompanhamento da professora Sandra Carvalho, a menina montava uma apresentação da pesquisa, que teve início a partir da sua própria curiosidade sobre o ato de respirar. “Eu achava que eram duas veias que saíam do nariz e iam direto para o coração, e quando o coração batia mandava o ar para fora de novo”, conta. A partir da primeira hipótese da respiração feita pela menina, os professores do hospital a estimularam a pesquisar sobre o assunto, até descobrir a teoria correta. “Partindo da vontade dela de saber como funciona a respiração, nós levamos outros conhecimentos e ela estudou ciências, leu bastante, escreveu, e agora ela vai fazer uma apresentação em Powerpoint para mostrar aos colegas o que ela aprendeu. Isso significa disseminar conhecimento”, declara a assistente de coordenação do setor de Educação e Cultura do hospital, Maria Gloss.
É nessa linha que funciona o trabalho realizado pela equipe de professores do Pequeno Príncipe. Formado por quatorze educadores – entre professores das redes municipal e estadual de ensino, além dos profissionais contratados pelo próprio hospital –, o setor de Educação e Pesquisa existe formalmente desde 2000, mas o atendimento escolar já é praticado na instituição desde 1989. Essa prática é apenas um exemplo do que hoje se conhece como pedagogia hospitalar.
A primeira classe hospitalar do país surgiu na cidade do Rio de Janeiro, no início da década de 50, no Hospital Municipal Jesus, e se tornou referência nacional no âmbito da educação especial transitória por manter suas atividades em funcionamento ininterruptamente até os dias de hoje. A importância das classes hospitalares já é reconhecida legalmente por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente Hospitalizado, na resolução nº 41 de outubro de 1995, que em seu item 9 fala sobre o “Direito de desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar durante sua permanência hospitalar”. Em novembro de 2000, foi aprovada a lei 10.685, que determina que hospitais ofereçam às crianças e adolescentes um bom atendimento educacional, que permita o desenvolvimento intelectual e pedagógico, bem como o acompanhamento do currículo escolar. Porém, mesmo com a pr evisão legal, a prática não é corriqueira. Ainda não são todos os hospitais pediátricos brasileiros que dispõem de uma estrutura adequada. Em todo o Estado de São Paulo, por exemplo, há cerca de 35 classes hospitalares em funcionamento – um número considerado pequeno perto do número de internações infantis.
A pedagogia hospitalar é um assunto em voga. Desde o surgimento da lei de 2000, vários cursos de especialização na área foram surgindo no país, o que vem chamando a atenção de pedagogos e educadores que desejam exercer a profissão em outro espaço, fora da escola. Entre as matérias ministradas nos cursos de especialização, estão “Infecção Hospitalar”, “Brinquedotecas em Hospitais”, “Psicopedagogia Hospitalar” e “Políticas de Humanização dos Sistemas de Saúde”. Porém, a necessidade de um preparo especial para atuar em classes hospitalares levanta polêmica, principalmente entre os profissionais que já atuam no setor. “Particularmente, não acho que seja necessária a especialização em educação hospitalar. A nossa equipe é composta por quatorze professores, todos com anos de experiência em sala de aula, e não tem nada que nós façamos aqui que não tenhamos feito na escola. O que precisamos é de bons professores” , declara o coordenador do setor de Educação e Cultura do Pequeno Príncipe, Cláudio Teixeira, que é psicólogo e desde que saiu da faculdade trabalha com educação. No hospital, ele começou a trabalhar em 2000, quando a instituição passava por vários processos de humanização do atendimento. Em 2002, foi aberto o setor de Educação e Cultura, do qual ele assumiu a coordenação.
Cláudio explica que todas as atividades propostas às crianças internadas e o desempenho que elas alcançam estão em constante avaliação, dentro de um contexto pedagógico. A partir do quinto dia de internamento da criança, os professores já iniciam o trabalho com o novo aluno. Todo o acompanhamento pedagógico é feito pela equipe do hospital, mas a escola da criança é sempre notificada do trabalho que está sendo realizado durante o internamento. Essa conexão escola-hospital permite ao aluno o acompanhamento do conteúdo que está sendo passado à turma a qual pertence. “Nós sabemos que essas crianças estão aqui para um sério tratamento de saúde, e esse é o foco. A qualquer momento ela pode ser chamada a fazer um exame ou uma cirurgia. Por isso, não são elas que vêm até nós. Nós vamos até elas, levando atividades educacionais e culturais na enfermaria, no isolamento ou no corredor”, declara o coordenador. Duran te o período de internamento, o professor registra tudo o que foi trabalhado em uma ficha de tutoria. Após a alta, o educador escreve um parecer, que é enviado à escola junto com todas a atividades desenvolvidas pelo aluno no hospital. Esse documento auxiliará a instituição de ensino no processo de readaptação da criança ao dia-a-dia escolar.
Entre as várias opções de atividades oferecidas pelo hospital, uma que se destaca é a “Ciranda do Saber”, em que um paciente faz uma apresentação sobre determinado tema que pesquisou. A atividade acontece na sala própria do setor e reúne crianças, adolescentes, pais, acompanhantes e professores em uma grande roda de conhecimento. No dia da visita da reportagem ao hospital, estava acontecendo uma ciranda sobre o Egito, apresentada por uma paciente da ortopedia, estudante do 2º ano do ensino médio. O que mais impressionava nos pacientes que acompanhavam a apresentação da colega era a curiosidade que saltava em seus olhos, a sede de aprender, de descobrir, que vencia a fraqueza e as doenças. Por isso, o ambiente não assusta – encanta. Principalmente por uma característica importante de qualquer classe hospitalar, seja ela onde for: a diversidade, um desafio para muitos professores.
Foi essa característica que conquistou de vez a professora Maria Gloss. Há três anos trabalhando no hospital, depois de anos de trabalho em escolas municipais de Curitiba, Maria declara que foi ali que ela encontrou a escola que procurou a vida toda. “Aqui a gente tem a oportunidade de trabalhar com a vida. É a escola mais saudável que eu conheço. Isso parece muito dual, porque eu estou dentro de um hospital. Mas é um espaço de cura até para a escola, o que eu vivencio aqui é isso”, emociona-se.
Também foi nessa diversidade que a professora Eneida Simões da Fonseca se realizou profissionalmente. Para Eneida, que é PhD em Desenvolvimento e Educação de Crianças Hospitalizadas pelo Institute of Education – University of London e tem mais de vinte anos de experiência na área, o professor que deseja trabalhar no âmbito hospitalar precisa de sensibilidade para atender as necessidades e interesses que emanam na diversidade. “Há duas características essenciais a um professor no ambiente hospitalar. Uma é estar consciente de que há um espaço para ele no ambiente hospitalar. Para tal, não deve esquecer que isto implica uma outra característica, que é o compromisso com o direito da criança doente à escolaridade. Acho um equívoco o professor ter que dominar aspectos médicos. O que é necessário é o domínio da transdisciplinariedade, da diversidade dos alunos, para atender suas necessidades de aprendizado”, de clara.
Por Renata Sklaski, publicado na revista Profissão Mestre.
Fonte: JORNAL VIRTUAL PROFISSAO MESTRE
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