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Imagem publicada - A foto colorida de uma escultura em formato de uma grande gota de água, pintada em cores vibrantes, com o título: A GOTA DA VIDA, que foi desenhada por alunos da Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral (APPC), em Coimbra, Portugal, com um sol amarelo e sorridente ao alto, montanhas multicoloridas, gotinhas que curtem essas belezas, uma árvore verde com frutos vermelhos, flores diferentes e de cores diferentes, e um mar azul com peixes multicoloridos em amarelo, verde, violeta e vermelho. Uma criação de pessoas com deficiência na comemoração de mais um dia importante para a preservação da vida no planeta Terra. Quem sabe um desejo ou aspiração, para além de nossas ''deficiências'', do mundo que todos deveríamos construir...
Enfim a Primavera. Comemoramos cada flor dos ipês e das muitas árvores que nos sensibilizam em seu dia. Abrem-se os coloridos cenários, como a Gota da Vida, que nos encantam. As diferenças ficam vivazes nas cores diferenciadas de cada flor, em cada árvore. Será que as outras primaveras que comemoramos em 21 de setembro também são multicoloridas? Estaremos todos reconhecendo na diversidade das nuances em cada pétala, folha ou caule; a mesma e criativa diversidade que nos compõem como seres humanos?
Não estou ''naturalizando'' nossas diferenças a partir da Natureza. Estou buscando alguma forma de aplicar essas mesmas visões multicoloridas em temas mais complexos que hoje se comemoram: o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência, o Dia da Àrvore, o Dia Mundial para não esquecer do Alzheimer, Dia do Fazendeiro, Dia Internacional da Paz, Dia para a votação da Emenda 29 (Saúde) e um dia para não esquecer da nossa História: a merecida e indispensável Comissão da Verdade.
E o que estará transversalizando estes eventos? Será que estamos em um alvorecer de uma nova Primavera dos Direitos Humanos? Ou apenas nos "iludimos" em um tempo de hiper-visão do mundo capitalista?
Estamos, como espectadores ou espec-atores, em mais uma data para comemorar ou para lembrar da Diferença? Desejo, sinceramente, que apenas estejamos, coletiva e individualmente, tentando transformar em ações algumas das nossas concepções, mudando de paradigmas. E, catalizar essa mesma força para a demolição dos pre-conceitos sobre as diferenças.
Em especial as que afetam nossas memórias históricas da Escravidão, das Eugenias, da Ditadura Militar e das Marginalizações e Exclusões Sociais. Temas que cabem muito bem em baús ou sotãos do esquecimento cultural e histórico brasileiro.
No dia 21 de setembro estão marcadas algumas ''comemorações'' em todo o País. E um bom número será de confirmação de conquistas históricas de todos os brasileiros e brasileiras. Mas o que semeamos, ou as pequenas flores ou árvores de direitos ainda precisam de muito adubo legal, muita água de mudanças e atualizações e, indispensavelmente, uma contínua avaliação dos solos de cidadania onde se enraizam e se confirmam.
Quanto ao campo das deficiências e das pessoas que as vivenciam, em suas multiplicidades de ser e estar, podemos dizer que muitos avanços tivemos nos últimos anos. Brotaram e cresceram muitas árvores e raízes legitimadoras. A começar pela confirmação de uma dupla mudança de paradigmas com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Ao ser ratificada, assim como seu Protocolo Facultativo, conseguimos a abertura para que seus artigos, fundamentados e fundamentadores de Direitos Humanos, pudessem estimular a ativa participação de todos na sua efetivação e avaliação crítica.
Abrimos uma grande vereda por onde se dará a inclusão social de milhares de pessoas com deficiência, em especial as que vivenciam as vulnerações do cotidiano brasileiro: pobreza, invisibilidade social, desfiliação, preconceitos e estigmas arraigados que aceleram sua exclusão e marginalização.São milhares se não forem milhões de cidadãos e cidadãs. Muitos que atravessam a realidade do que devemos defender: os direitos inalienáveis à Saúde, à Educação e à Preservação do Meio Ambiente.
O mundo em concertação na ONU, as pilastras da àcropole ateniense balançam a economia mundial, fala-se, a granel, de combate à corrupção, apela-se para a transparência com as ações dos Estados. Mas nossas ações não podem cessar sua semeadura micropolítica, sem a mesma pretensão estatal, pela afirmação de todos os direitos humanos.
Não podemos perder de vista nosso papel de pequenos "agricultores/fazendeiros/sem-terra" de revoluções moleculares em territórios menores. Será em nossas construções cibernéticas nas redes sociais? será no emponderamento de nossos movimentos de protesto e de afirmação de uma gramática civil? será em nossos conselhos municipais de defesa de direitos, capilares de um exercício de cidadania indispensável?
Escrevi para o livro Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência Comentada, e hoje reafirmo que: "... Há que ter dignidade para que possamos afirmar a vida. A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que regula o direito das pessoas com deficiência de viverem de forma independente e serem incluídas nas suas comunidades, confirma o papel dos Estados Partes, dizendo que: “ reconhecem o direito à igualdade de condições de todas as pessoas com deficiência para viverem em comunidade, com opções iguais aos demais, e adotarão medidas efetivas e pertinentes para facilitar o pleno gozo deste direito pelas pessoas com deficiência e sua inclusão plena na comunidade...”([1]).
Portanto, nessa alegoria primaveril, é urgente uma busca coletiva, para além das marchas públicas e notórias, para além de nossas petições, de uma interrogação sobre nossa compreensão de diferença e de igualdade. Não podemos nos esquecer a igualdade que defendemos para que o Direito à Vida digna seja conquistado para todos e todas. Mas não podemos perder, pela exigência de segurança social, habitação, condições de alimentação e sobrevivência com dignidade, a exigência do respeito às singularidades, às individualidades e às diferenças.
Há sempre o risco de um ''falso'' igualitarismo macropolítico nos rondando. Há sempre os que nos dizem criarem leis para nos proteger, coletivamente, mas massacrando nossos direitos individuais. Não podemos pisar nos trevos, nascendo dentro dos mínimos jardins, mesmo os mal cuidados ou abandonados, alegando que estamos preparando o solo para plantar, uniforme e homogeneizadamente, a serialização dos eucaliptos.
Eles podem sugar toda a água, e a Gota da Vida, que faz germinar a diversidade e diferença. Podemos criar desertos áridos e infecundos na pura afirmação de direitos econômicos que só alimentarão muito poucos, muitos que se tornarão os privilegiados. E a privação torna-se natural.
HOJE, 21 de setembro de 2011, com um olhar para além do olhar, hoje mais fascistante do que democrático, pode ser mais um dia para não esquecermos que todos os caminhos das diferenças, nos levarão ao que Boaventura, ao criticar a hipocrisia democrática diante das discriminações étnico-raciais, nos disse: ..."Admite que os negros e os indígenas são discriminados porque são pobres para não admitir que eles são pobres porque são negros e indígenas..." .
E que quando estes marginalizados se organizam, questionando seu status de Vidas Nuas ou desqualificadas, eles (nós) se distinguem por duas razões: "Em primeiro lugar, empenham-se na luta simultânea pela igualdade e pelo reconhecimento da diferença. Reinvindicam o direito de ser iguais quando a diferença os inferioriza e o direito de serem diferentes quando a igualdade os descaracteriza. Em segundo lugar, apostam em soluções institucionais dentro e fora do Estado para que o reconhecimento dos dois princípios seja efetivo..." [2]
Nesse momento é que devemos nos incluir nas propostas de discussão sobre as leis que, sob formato de Planos Nacionais ou Estatutos ou Leis ou Decretos. Hora e urgência, para que o lema Nada sobre Nós, Sem Nós, da Vida Independente, possa ser uma possibilidade de uma outra primavera, um outro e renovado modo de empatia e respeito à Diferença dos Outros em Nós. E a Diferença nossa de cada dia estará semeando/colherndo a igualdade de Direitos...
PS - Ah! já ia me esquecendo. Dia 21/09/11 também está sendo o dia escolhido para uma ''paralisação'' dos Médicos que atendem Planos de Saúde. Espero que os exames de laboratório que fiz não tenham seu resultado adiado, pois a sua e a minha Saúde, assim como a Dona Morte, não deixarão de se apresentar, mais cedo ou mais tarde... Torço para que as operadoras reconheçam o quanto tem explorado, economicamente, a classe médica e seus usuários, e que nós reconheçamos o quanto somos participantes dessa exploração diante do Direito à Saúde.
Desejo que a Primavera da Saúde também receba a mesma atenção e cuidado para que o SUS possa superar todos os desafios e impasses que a saúde coletiva e pública brasileira tem experimentado....
[1] Bueno, Luiz Cayo Pérez & Jimenez, Esther Trujillo, La Discapacidad como una questión de derechos humanos – una aproximación a la Convención Internacional sobre los Derechos de lãs Personas com Discapacidad, Madrid, Espanha: Grupo Editorial Cinca, S.A., 2007
[2] Sousa Santos, Boaventura - As dores do pós-colonialismo - Publicado na Folha de São Paulo em 21 de Agosto de 2006 - http://www.ces.uc.pt/opiniao/bss/163.php
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