Fazendeiros criam clima de terror desmentido pela Polícia Federal
Renato Santana
de Itabuna (BA) para o Brasil de Fato
Na Polícia Federal (PF) de Ilhéus estão concentrados os inquéritos recentes envolvendo o conflito entre indígenas e invasores. O mais polêmico envolve o assassinato de Ana Maria Santos Oliveira, 33 anos, que levou um tiro quando homens armados e encapuzados interceptaram a caminhonete de seu esposo e atiraram contra o veículo. O crime ocorreu no dia 9 de abril na zona rural de Itajú do Colônia, numa estrada de terra incidente na terra indígena, mas até então não retomada pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe, que estavam a 10 km do local.
Duas horas depois do assassinato, homens incendiaram um dos imóveis da fazenda Vitória, de Armando Pinto. Os criminosos tiveram a “delicadeza” de retirar da casa alguns móveis antes da ação. Da mesma forma, não mexeram nos mais de 5 mil litros de leite estocados numa câmara gelada, assim como deixaram intactas as instalações de um laboratório de sêmen – a fazenda é destinada a criação de éguas para inseminação artificial de cavalos de raça.
Indígenas em área retomada no sul da Bahia
no mês de abril - Foto: Renato Santana
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O crime logo foi apontado como fruto do conflito entre fazendeiros e indígenas, deixando um clima de culpa aos Pataxó Hã-Hã-Hãe. Nas matérias da afiliada da Rede Globo na Bahia, declarações de ruralistas davam conta de desaparecimentos de gado, trabalhadores alvejados por armas de grosso calibre e um clima de terror disseminado pelos indígenas. O inquérito estava com o delegado da Polícia Civil de Itaju do Colônia, Francesco Denis Santana. Porém, o delegado da PF, Fábio Marques, declarou à imprensa baiana que todos os indícios apontavam para uma ação de jagunços, não de indígenas. O delegado observou que tanto o assassinato quanto o incêndio não eram modos de agir dos índios. Em nenhuma das matérias da Rede Globo tais declarações apareceram.
Em seguida ao depoimento do delegado da PF, o delegado da Civil logo se pronunciou dizendo que suas investigações caminhavam para o mesmo lado que as observações de seu colega. Se contradizendo, no entanto, Santana passou a desdizer tais posicionamentos públicos afirmando que os indígenas possuem armas de grosso calibre e que a participação deles não estava descartada.
Inconclusivo
A delegacia de Itaju do Colônia fica numa casa antiga com detalhes em azul, enfrente a principal praça da cidade. Era 20 de abril e Santana já não estava mais com o inquérito da morte de Ana Maria quando estacionou sua Hilux preta na porta do distrito. Desse modo, não tinha mais autorização para falar oficialmente com a imprensa. Limitou-se a conversar de maneira informal, emitindo opiniões sobre o caso. Santana diz que o processo chega às mãos da Polícia Federal inconclusivo e acha difícil que os culpados sejam apontados, porque o assassinato ocorreu num lugar ermo e as únicas testemunhas são os ocupantes da caminhonete. Santana não comentou sobre a ação de pistoleiros quando questionado, mas ressaltou, sob a mesma indagação, que nascera na região e nunca tinha visto índios por ali. Não obstante, o delegado tratou de emendar que a terra indígena Caramuru- Paraguassu não estava demarcada – contrariando assim os documentos oficiais e as perícias realizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Em 18 abril, a delegada da PF de Ilhéus, Denise Dias, ainda não tinha tido contato com o inquérito sobre a morte de Ana Maria. Ainda assim, a delegada tomara conhecimento do assassinato, mas não das declarações de seu companheiro de polícia, Fábio Marques. Os pronunciamentos oficiais estão concentrados nas superintendências de Salvador e Brasília. A PF mantém o inquérito aberto, correndo sob segredo de Justiça. A delegada reafirmou a inexistência de reféns sequestrados ou de assassinatos cometidos por indígenas – denúncias que partiram dos próprios fazendeiros – bem como retenção de gado nas áreas retomadas pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe
Informações apuradas em Itaju do Colônia indicavam a prisão de 30 pistoleiros. Denise não confirmou, alegando que não poderia conceder esse tipo de informação, mas não desmentiu rechaçando apenas a quantidade – o que se deduz que de fato ocorreram prisões, mas de um número menor de criminosos. A delegada deixou claro que a polícia seguirá acompanhando de perto a situação, como já vem fazendo na retirada do gado, em passagens pelas reocupações indígenas e fazendas ainda na posse dos invasores.
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