no Tijolaço
Não posso, por óbvio, dizer que alguns médicos inscritos no “Mais Médicos” que abandonaram o programa no primeiro dia de “trabalho”, jamais pretenderam trabalhar e se inscreveram com o único objetivo de tumultuar o programa.
Mas que parece, parece.
Julgue você mesmo o caso destes quatro, citados hoje na num único trecho de matéria de O Globo:
“Na cidade do Rio, dos 16 médicos selecionados, dez faltaram. Desses, três já desistiram de assumir a vaga. Um deles é o alergista Ulisses Linhares, de 54 anos.
— Desisti, achei que não valia a pena pelo salário. O programa é necessário, mas enquanto o governo não der garantias e estabilidade, ele não vai conseguir levar os médicos a essas áreas distantes. É uma utopia achar que o médico recém-formado vai para o interior. Com uma salinha qualquer, nesse mesmo interior, atendendo duas vezes por semana, cobrando R$ 60 a consulta, o médico já ganha muito mais — disse Linhares: — Enquanto o govemo não pagar de forma digna, o médico não vai ter condição de exercer Medicina com dignidade.
Linhares é casado com a pediatra Clarissa Rego Medeiros, que também havia se inscrito e desistiu anteontem.
Carlos Muylaert, alergista e imunologista com consultório na Barra, Zona Oeste, também desistiu. Ontem, ele disse estar de licença médica por conta de uma cirurgia na coluna.
Município que figura na lista dos prioritários, Japeri iria receber uma médica brasileira. No entanto, Andrea Santos Nunes avisou no último domingo à Secretaria municipal de Saúde que não ia assumir. Alegou que a cidade fica muito longe de Miguel Pereira, onde mora.”
Vamos a eles, um por um.
O alergista Ulisses Linhares, que se candidatou a trabalhar 40 horas, é professor da Unirio, com jornada de 40 horas. Aparece na internet com consultórios na Tijuca e em Bento Ribeiro. Portanto, não deve ter dificuldade em, como ele mesmo diz, “com uma salinha qualquer, nesse mesmo interior, atendendo duas vezes por semana, cobrando R$ 60 a consulta”, ganhar os R$ 10 mil que acha pouco no “Mais Médicos”. Curioso é que, segundo o Portal da Transparência, ganha menos de R$ 4,5 mil na Unirio.
Sua mulher, a pediatra Clarissa Rego Medeiros, trabalha no Hospital Universitário Gafreé Guinle, com jornada de 60 horas, também é (ou era, pelo menos) oficial médica do Corpo de Bombeiros, tendo sido promovida a capitã, no Diário Oficial de 20/12/2011. Pode ser um caso de hominímia, mas a bombeira também é pediatra, o que torna isso quase impossível.(acréscimo às 18:42. É capitã e está ativa)
Carlos Muylaert Torrico, o terceiro médico, trabalha em Búzios, para a Prefeitura, num posto de saúde em Jacarepaguá e em seu consultório no Recreio dos Bandeirantes, onde atende o pessoal do Exército, conforme contrato publicado no Diário Oficial de 27 de setembro passado, no valor de R$ 350 mil! Aliás, contrato que vem sendo seguidamente prorrogado desde 2009 e que vai até o final deste ano. Como isso dá quase R$ 20 mil mensais, imagino que não lhe sobre muito tempo para as 40 h semanais do mais médicos.
Por fim, sobre a última personagem, Andrea Nunes Pereira, não se pode fazer afirmações por pesquisa na internet, pelo risco de homonímia. Mas para quem não sabe onde ficam os dois locais citados, informo que distam 40 km (24 km em linha reta), em estrada, o que dá menos de 40 minutos. Aliás, tem ônibus direto e a tarifa é R$ 7,50.
A nenhum deles se critica a qualificação profissional. Mas que a história de “desistência” não cola, não cola mesmo.
Por: Fernando Brito
Nenhum comentário:
Postar um comentário