Aos que ainda cobram um programa de governo do capitão presidente, neste final do primeiro ano de mandato, o Plano Bolsonaro está a cada dia mais claro: é destruir a Educação, a Cultura e o Meio Ambiente para poder reinar absoluto. Simples assim.
Não por acaso, esses são os três setores da sociedade brasileira historicamente com maior capacidade de mobilização contra os governos tiranos.
Estudantes, professores, artistas e ambientalistas sempre estiveram na linha de frente na defesa da democracia e da liberdade em nosso país.
É até difícil acreditar que Fernanda Montenegro e Abraham Weintraub, Chico Buarque e Ricardo Salles, Paulo Freire e doutora Damares tenham nascido e vivam no mesmo país.
Com a destruição dos sindicatos e suas centrais, consumada pela “reforma trabalhista”, e a implosão dos partidos promovida pela Lava Jato, a única resistência que resta ao bolsonarismo em marcha vem das universidades, dos palcos e das ONGs que defendem a Amazônia e os povos da floresta ameaçada.
Os próximos alvos anunciados neste final de ano são os reitores das universidades federais e os estudantes em dívida com o Fies.
“MEC muda regra do Fies e pode cobrar na Justiça 584 mil alunos em atraso”, informa o Estadão deste sábado.
Criado nos governos do PT para facilitar o acesso de alunos pobres à universidade, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) vai oferecer menos financiamentos a partir de 2021 e exigirá nota mínima de 400 na redação do Enem para firmar contratos.
Até hoje, a cobrança de prestações atrasadas era feita no âmbito administrativo, mas nesta sexta-feira o MEC do inominável Weintraub resolveu fazer a cobrança judicial dos contratos firmados até o segundo semestre de 2017.
Se antes os estudantes já não conseguiam pagar as prestações, com o aumento do desemprego e a queda na renda, muito menos agora terão condições de saldar uma dívida que já chegou a R$ 12 bilhões.
Ou seja, mais de meio milhão de estudantes podem ser jogados para fora das universidades pela Justiça.
Embora a ditadura ainda não tenha sido oficializada no Brasil, os métodos são os mesmos dos militares que deram o golpe em 1964 e colocaram a Educação e a Cultura na linha de tiro logo nos primeiros dias.
Uma das primeiras medidas dos generais foi acabar com o Programa Nacional de Alfabetização, baseado no método de Paulo Freire, criado em janeiro de 1964 pelo presidente deposto João Goulart.
Não é de agora que os militares qualificam o maior educador brasileiro de todos os tempos como “energúmeno comunista”.
No dia 2 de abril de 1963, na solenidade de formatura da primeira turma de alfabetização de adultos em Angicos, no Rio Grande do Norte, com a presença de Jango, o então comandante do IV Exército, general Humberto Alencar de Castello Branco, que um ano depois se tornaria ditador empossado, não gostou do que viu e ouviu.
Durante o jantar oferecido às autoridades naquela noite, Castello Branco disse ao secretário de Educação do Rio Grande do Norte, Calazans Fernandes, que aquele trabalho de alfabetização serviria para “engordar cascavéis nesses sertões”.
Ao próprio Paulo Freire, o general disse que já havia sido alertado sobre o seu “caráter subversivo” e que agora estava convencido disso por sua defesa de uma “pedagogia sem hierarquia” (página 72 do livro “O Educador”, de Sergio Haddad, sobre o qual já escrevi na coluna anterior).
O Programa Nacional de Alfabetização tinha como meta alfabetizar 5 milhões de pessoas, que ganhariam o direito de votar, ampliando o colégio eleitoral em quase 40%, um golpe fatal nos currais de gente cevados pelos coronéis nos grotões do país, que sobrevivem até hoje.
Paulo Freire teve que partir para um longo exílio e o Brasil viveria a longa noite de 21 anos de uma feroz ditadura, que prendeu, torturou e matou, e acabou com as liberdades públicas e os direitos civis.
O Plano Bolsonaro nada mais é do que o prolongamento desse regime de exceção e arbítrio, agora pelo voto.
Ninguém pode alegar que foi enganado: durante toda sua campanha, o ex-capitão anunciou o que faria e agora suas ameaças à democracia estão sendo cumpridas, uma a uma.
Bom final de semana.
Vida que segue.
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