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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O JUQUINHA, E SUA CADEIRA , por uma Educação Diferente


Imagem publicada- foto de uma sala de aula no Mato Grosso, onde estão sentadas diferentes crianças, sentados em suas carteiras enfileiradas, e onde não encontramos nenhuma criança com deficiência, à primeira vista, tendo um menino de olhar interrogativo e calçando um par de sandálias (tipo havaianas) que se destaca nessa foto de Lenine Martins (Secom-MT). Ele representa o personagem criado por meu texto abaixo, caso consigam vê-lo ou imaginá-lo sentado em uma cadeira de rodas: o Juquinha.

Em homenagem a todos e todas que persistem na luta por uma Educação Diferente, Inclusiva, Laica, Pública e como um Direito Humano, republico o texto que foi distribuído no I Encontro Interestadual por uma Educação Diferente, realizado com o apoio e no espaço da UNIRIO, na cidade do Rio de Janeiro, RJ, em 1997.

Era uma das primeiras iniciativas do DefNet em prol do debate, discussão acadêmica ou não, entre os diferentes protagonistas do movimento em prol da Educação Inclusiva no Brasil. 

Tive a honra de organizar este evento, assim como de conhecer muitos e muitas que ainda estão ativamente discutindo e propagando as idéias fundamentais do processo de inclusão escolar, como, por exemplo, a Profª Drª Rosita Edler de Carvalho, que já me ajudou a colocar os pingos nos "is" da Educação Inclusiva.

O tempo passou mas nossas lutas continuam na direção do aprender a aprender, e a cada dia mais ficam claras as heterogeneidades humanas que compõem os alunos do atendimento educacional especializado, e para tanto reconhecer suas diferenças poderá nos levar àquela tão sonhada e desejada Educação Diferente. Uma Educação, fundamentada em Direitos Humanos e no Multiculturalismo, tão necessário e tão combatido agora, uma dedicada educação para todas as formas e singularidades de Diferenças.

O JUQUINHA, E SUA CADEIRA ...”

(uma singela homenagem a Jacques Prévert e Cora Coralina, poetas-professores)
(recriação livre de texto de H. E. Buckley)

Once upon a Time, Era uma vez um menino, o Juquinha, muito Diferente, que contrastava com a sua escola muito Igual a todas, grande, cheia de escadas, alunos, professores, e a temível Diretora. Quando, um dia a mãe do Juquinha descobriu que ele precisava ir para escola, ela procurou, e descobriu que não tinha escola para “gente diferente” como ele. 

E então ela tentou e conseguiu que esta escola igual a todas deixasse o pequeno Juquinha entrar pela porta da rua, todo feliz e inocente, porém ainda diferente. A escola continuava grande, enorme, mas já não era tão grande como antes do Juquinha entender o que era a ESCOLA.
Um dia, numa daquelas manhãs que o Sol entra pela janela da sala de aula, a professora D. Norma, disse: “Hoje nós vamos fazer um desenho”.Que bom!” pensou o Juquinha, que, aliás, não falava direito além de ser diferente.Mas que sabia desenhar, e gostava de rabiscar papéis (e até paredes, quando a sua mãe não estava presente), ele desenhava bichos, brinquedos, meninos e meninas, e um ‘tal’ de ‘doutor’. Ele pegou sua caixa de giz de cera, pois isto ele conseguia pegar com a mão direita..., e começou a desenhar.
Então, de súbito, D. Norma disse: “Stop, Parem!!! Ainda não é hora de começar, eu não autorizei ninguém ainda...”. Ela olhava ‘furibunda’ para o Juquinha... E esperou todos os outros da sala ficarem ‘quietos e arrumadinhos’ para dizer: “Podem começar... e frisou, Nós iremos desenhar flores e árvores”, e começou como lápis verde, e disse (solene): !”Como eu os amo muito Eu vou ensinar e mostrar como deve ser feita uma Flor...”. 

E fez uma flor vermelha com pétalas amarelas e caule verde, bem certinha, e com as raízes fincandinhas no chão... TUDO muito arrumadinho e certinho como ela gostava...Juquinha olhou, olhou e tresolhou a flor (ele ‘usa’ uma grande armação com lentes muito grossas, parecendo os antigos professores com seus óculos, os Lentes). 

E não gostou da flor. Gostou mais dos bichos e das pererecas que havia desenhado, mas não podia dizer isto, além do que ele não falava direito, né??... Virou o papel, com algum esforço e desenhou uma flor IGUAL à da professora Norma. Era vermelha e com o caule verdinho.

Outro dia, durante a aula, depois de Ter dificuldade para entrar na sala de aula, o Juquinha ouviu a professora dizer: “Hoje nós iremos fazer algumas coisas com a Argila”.

Mais uma vez,pensou o Juquinha, eis a minha oportunidade de mostrar o que sei fazer com o barro, apesar de Ter o braço meio torto...Ele gostava de criar pequenos homenzinhos com a argila, e até carrinhos e caminhões ele já conseguiu fazer (muito embora esses objetos não sejam tão perfeitinhos assim, eles ficam meio tortos, feito o braço dele...) E foi logo pondo a mão na massa, aliás no barro.

Aí ouviu a voz retumbante de D. Norma: “ESPEREM!, NÃO mandei ninguém começar ainda..!!! e após aquele silêncio terrível disse do alto de sua capacidade e poder: “Hoje nós vamos modelar um prato... E eu vou mostrar como se faz isso direito. E vocês podem começar..” Fez um prato certinho e redondinho, perfeitinho, e até parecia muito bonitinho.

E o Juquinha olhou, olhou e tresolhou (às vezes as lentes ficam sujas, ainda mais no meio de tanto barro, e com tanto descontrole das mãos...), e ele viu que começava a fazer um homenzinho, baixinho, gordinho, defeituoso por acaso, mas ele NÃO podia fazer isto. E então ele amassou a argila e fez um prato, um prato bem fundo, embora raso e igual ao da professora.

Então sentado naquela cadeira, uma cadeira que nunca desgrudava dele, ele procurou aprender que era melhor esperar a D. Norma autorizar, com o olhar e sua fala forte, a fazer exatamente como ela. Afinal quem estava ensinando naquela escola ???!!! E logo em seguida aprendeu também a ficar quietinho, arrumadinho, sentadinho e bem comportado. Afinal quem estava ali para ser educado ???!!!

UM dia ele, o Juquinha teve de mudar de Escola. Esta escola era ainda maior e mais escola que a que tinha a D. Norma. Ele tinha de subir as grandes escadarias com a sua cadeira colada no traseiro, com pessoas ajudando, e entrar por aquela porta estreitinha da sua sala...

UM dia a sua nova professora, D. Orma disse: “Hoje, meus pequeninos, nos vamos fazer um desenho”.
QUE maravilha !!” pensou e exultou o Juquinha, e esperou que a ‘fessora’ dissesse o que desenhar. 

E ela, como perdera “N” coisas de seus conceitos e preconceitos, não disse nada. Apenas andava calmamente pela sala. E se aproximou do Juquinha e perguntou:
Você não quer desenhar ??” E o Juquinha perguntou:
Mas desenhar o quê ??”
Eu não posso saber até que você faça” respondeu D.Orma.
Então o que posso fazer ??” retrucou o Juquinha,
O que você gostar e o que conseguir fazer...” ,
Mas eu aprendi a copiar e fazer sempre IGUAL, todo mundo deve ser igual na escola...” diz consternado, o ‘pobre” Juquinha,
Mas se todo mundo fizer sempre o mesmo desenho, e ninguém for diferente, todo mundo fizer flores vermelhas e caules verdes, ficaremos todos IGUAIS, e eu não vou poder saber quem foi o “artista” que andou pintando lindos homenzinhos, baixinhos, gordinhos e diferentes nas paredes desta sala, SEMPRE COM UM FLOR DIFERENTE NAS MÃOS...”

e o JUQUINHA DESENHOU PELA PRIMEIRA VEZ UMA CADEIRA DE RODAS, com um menininho segurando uma flor na mão...”


(Texto elaborado para o I Encontro Interestadual por uma Educação Diferente promovido pelo DEFNET Centro de Informática e Informações sobre Paralisias Cerebrais, em agosto de 1997 – Rio de Janeiro- RJ)

copyright – Jorge Márcio Pereira de Andrade 1997/2012 (favor citar o autor em republicações livres pela Internet ou outros meios de comunicação de massa)

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